Criação de Filhos

A Proteção do Modelo Divino- Lição 6/13

Temas Gerais
11
min de leitura
Modo noturno

Introdução

Como ponto de partida da presente lição, vale recordar o modo divino de lidar salvadoramente com a humanidade:

  • Há a permanente coexistência de duas sementes, a da mulher e a da serpente, que, nos eventos do Êxodo, são representadas pelos filhos de Israel e pelos egípcios;
  • Os filhos de Israel, que representam nesse estágio da salvação a semente da mulher, recebem a lei por meio de Moisés para viverem como um povo bem aventurado, comprado pelo sangue do cordeiro, separado dos demais povos;
  • Para tanto, o povo do pacto deveria passar de uma geração a outra a razão e o significado dos preceitos divinos. 

Assim, continuamos aprendendo que Deus se deleita em salvar e separar para si famílias, o que deve estimular nos crentes de hoje um compromisso inadiável com o discipulado dos filhos.

Por tudo o que temos visto, podemos concluir que Deus separou um povo para si, para ser o seu povo peculiar e objeto do seu amor especial. Na maior parte da história do Antigo Testamento, esse povo santo, de propriedade exclusiva de Deus, era composto em sua maioria pelos filhos de Israel, neto do patriarca Abraão. Esse povo era, naturalmente, constituído de famílias e o conhecimento salvador deveria ser disseminado também no contexto do lar, de pai para filho. 

Antes da lei, a tradição a ser comunicada era basicamente oral. A partir de Moisés, a revelação passou a ser escrita, momento em que Deus concedeu pela primeira vez um código objetivo e sucinto a ser igualmente ensinado pelos pais aos filhos. Tratava-se da Lei de Moisés, cujo núcleo central reside nos Dez Mandamentos, dentre os quais se destaca como o primeiro e grande mandamento o amor a Deus com a totalidade da vida: “Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de toda a tua força” (Dt 6.5). 

Esse modelo de povo santo para Deus, consistente de famílias dentro das quais a revelação deveria ser transmitida de pais a filhos, foi objeto da proteção especial de Deus. O modelo, pois, deveria ser preservado! Algumas instituições e ordens dadas a Israel devem, portanto, ser analisadas como estruturas que dão suporte e resguardam esse padrão, dentre as quais se destacam a proibição de casamentos mistos, a multiplicação de filhos no contexto do casamento, a preservação da autoridade dos pais e a proteção do próprio casamento. Senão, vejamos.

A proibição de casamentos mistos

Mesmo antes da Lei de Moisés, já o sabemos, dois povos – a semente da mulher e a semente de Satanás – coexistiam. Houve, porém, uma gigantesca degradação moral na civilização pré-diluviana forjada pela mistura entre esses povos por meio de casamentos entre os “filhos de Deus” e “as filhas dos homens” (Gn 6.1). 

A partir da Aliança da Lei, advertências divinas foram dadas no sentido de que não houvessem casamentos entre israelitas e gentios, porque isso traria quase invariavelmente enfraquecimento da fé e apostasia: “Abstém-te de fazer aliança com os moradores da terra para onde vais, para que te não sejam por cilada… para que não faças aliança com os moradores da terra; não suceda que, em se prostituindo eles com os deuses e lhes sacrificando, alguém te convide, e comas dos seus sacrifícios e tomes mulheres das suas filhas para os teus filhos, e suas filhas, prostituindo-se com seus deuses, façam também que os teus filhos se prostituam com os seus deuses” (Ex 34.12,15,16).

Apesar das advertências divinas, houve muitos casamentos mistos que, em regra, trouxeram danos à nação eleita. Durante a peregrinação no deserto, Israel não sofreu maldição pelos encantos de Balaão (Nm 22-24), mas os casamentos com as filhas dos moabitas trouxeram consequências fatais (Nm 25). Os casamentos mistos de Salomão o levaram a grosseiras práticas idólatras (1Rs 11.1-8) e os judeus do período pós-exílico também se voltaram à idolatria por causa dos casamentos mistos (Ed 9). 

É importante ao modelo traçado por Deus que os casamentos se deem entre os crentes, uma vez que o ensino da Escritura deve ocorrer primariamente no contexto da família.

A multiplicação de filhos no contexto do casamento 

Vale lembrar que uma das ordens criacionais foi precisamente aquela para a multiplicação. A terra deveria ser cheia e ela, com toda a criação inferior, dominada (Gn 1.28). Após a Queda, Deus garantiu que a mulher continuaria capaz de gerar filhos (Gn 3.16), como também interpôs a bênção da inimizade entre a sua semente e a de Satanás (Gn 3.15). 

Nesse contexto, havia fortes razões para que as mulheres desejassem ter filhos, até com grande ansiedade! Isso em parte também se dava pelas restrições culturais a que mulheres sem filhos estavam sujeitas. Ana, por exemplo, falou sobre sua aflição por não poder ter filhos: “E fez um voto, dizendo: Senhor dos Exércitos, se benignamente atentares para a aflição da tua serva, e de mim te lembrares, e da tua serva não te esqueceres, e lhes deres um filho varão, ao Senhor o darei por todos os dias da sua vida, e sobre a sua cabeça não passará navalha” (1Sm 1.11). Ana entendia sua infertilidade como estando ela na condição de objeto do esquecimento divino. 

Além disso, Levítico 20.20,21 prevê como consequência de certos pecados sexuais a não geração de filhos. Como ter muitos filhos era sinal da bênção de Deus, de felicidade resultante de uma vida justa (Sl 127.3-5), ficar sem filhos era situação compreendida, por outro lado, como alguma forma de maldição. Uma família sem filhos implicava na prática em não perpetuar o nome, na perda de propriedades e na inexistência de uma certa realização pessoal.

Todo esse cenário não significa que não fossem praticados métodos naturais e mesmo artificiais primitivos de contracepção, mas, definitivamente, a condição de ter filhos era vista como a mais natural e desejada. Os abortos naturais eram encarados com muita tristeza e abortos provocados acidentalmente deveriam ser indenizados (Ex 21.22). Crianças especiais e com deficiência de qualquer tipo não podiam exercer o ofício sacerdotal (Lv 21.18), mas em hipótese alguma eram descartadas ou objeto de alguma política eugenista, como na cultura espartana, por exemplo, na qual se impedia de viver as crianças que nasciam com deficiências físicas. João 9 traz a cura de um cego de nascença realizada por Jesus, leia-se: a cura de um homem que não foi descartado quando criança. 

Se a obra de Deus se desenvolve por meio de famílias, seria apenas natural ver a multiplicação de filhos como uma grande bênção. 

A preservação da autoridade dos pais: “Honra teu pai e tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra que o SENHOR, teu Deus, te dá” (Ex 20.12)

O sentido mais básico e evidente do quinto mandamento é a sua proibição aos filhos de agirem com desprezo pelos pais. “Ouve a teu pai, que te gerou, e não desprezes a tua mãe, quando vier a envelhecer” (Pv 23.22). Um dos pecados de Jerusalém denunciados pelo profeta Ezequiel foi o de desprezar o pai e a mãe, citado ao lado de extorsões contra o estrangeiro e injustiça para com viúvas e órfãos (Ez 22.7). O profeta Miquéias, também ao descrever a corrupção moral de Israel, disse que “o filho despreza o pai, a filha se levanta contra a mãe, a nora, contra a sogra” (Mq 7:6). 

O desprezo que se tem em mente é a atitude, por ações, omissões, palavras ou gestos, que menospreza, que desmerece a autoridade, que não concede o devido respeito nem confere à palavra, aos conselhos e ao ensino a devida importância, como o que encontramos na postura dos filhos de Eli (1Sm 2.22-25). 

Uma vez que o ensino da revelação deve ocorrer prioritariamente no contexto da família, é evidente que a autoridade dos pais haveria de ser protegida.

A proteção do casamento 

Ao lado do quinto mandamento (“honrar pai e mãe”), o sétimo mandamento (“não adulterarás”) garante a integridade da família; aquele o faz resguardando a autoridade dos pais e este, fortalecendo a estabilidade do casamento. 

Sem dúvida, todas as formas pelas quais o mandamento em comento pode ser violado em nada são novas, exceto quanto à quase generalizada negação de sua pecaminosidade. Hodiernamente, cresce a aceitação geral no sentido de que os pecados de ordem sexual não possuem conotações morais que nos responsabilizem perante Deus, sendo tratados no máximo como uma questão de “orientação sexual” de cada um – um sentimento de atração afetiva e sexual que pode ser pelo mesmo sexo ou pelo sexo oposto. 

Seguindo a mesma sorte, o divórcio foi de tal modo banalizado que parece quase cruel ao mundo pós-moderno insistir em casamentos eivados de “incompatibilidade de gênio”. Diz-se que “Deus não pode querer a manutenção de um casamento que só traz infelicidade”.

Entretanto, o sétimo mandamento proíbe atos que tendam a provocar sexualidade fora dos padrões divinos, sendo estes mesmos atos, ainda que não conduzam às últimas consequências, por si mesmos, pecaminosos e violadores do preceito divino. 

O sétimo mandamento também proíbe o abandono do casamento e o divórcio não justificados do ponto de vista bíblico. O conselho do sábio é: “alegra-te com a mulher da tua mocidade” (Pv 5.18). Que Deus odeia o divórcio, também o diz o profeta Malaquias (Ml 2.16), porque Deus foi testemunha da aliança entre o homem e a mulher, sendo esta a companheira e a mulher da tua aliança (Ml 2.14).

Esse cuidado divino especial com o casamento, como também o ódio divino pelo fim do casamento, tem uma razão de ser descrita pelo profeta: “Não fez o Senhor um, mesmo que havendo nele um pouco de espírito? E por que somente um? Ele buscava a descendência que prometera. Portanto, cuidai de vós mesmos, e ninguém seja infiel com a mulher da sua mocidade” (Ml 2.15). Este texto do profeta é reconhecidamente difícil de traduzir e interpretar, mas sua mensagem é clara: a intenção do Senhor para com o casamento é que ele produza uma descendência de piedosos, como na ARA, ou uma descendência consagrada, como na NVI. Segundo visão do profeta, o divórcio frustra esse propósito de modo semelhante ao que fazem os casamentos mistos.

Conclusão

Por tudo o que temos visto, se perguntássemos ao arqui-inimigo de Deus o que ele costuma produzir para fazer barrar o progresso da obra de Deus, Satanás responderia assim: 

“Eu ataco a proibição de casamentos mistos, tentando incutir nas mentes que não se deve negar livre curso às grandes paixões do momento, porque afinal a vida humana é muito curta e retirar o máximo proveito de cada experiência é tudo o que importa. 

“Eu invisto fortemente contra a multiplicação de filhos, tanto produzindo em todo o mundo e em todas as culturas, inclusive por meio de descobertas científicas, práticas eugênicas, de descarte de crianças deficientes. Nesse sentido, também busco por todos os meios convencer a homens e mulheres que a pior coisa que lhes pode acontecer é a experiência da paternidade/maternidade. Digo-lhes por diversos canais que filhos são estorvo, que eles embaraçam a carreira profissional, retiram oportunidades, tolhem a liberdade, prejudicam o orçamento e danificam o corpo. Nesse mesmo propósito, eu fomento a conquista do direito ao aborto, mas sempre tratando-o com ares benevolentes, igualitários e humanitários.

“É também da minha predileção solapar a autoridade dos pais. Tenho me especializado em desfazer ou ressignificar antigos conceitos relativos à autoridade, obediência e respeito. Meu grande investimento está focado em libertar a infância e a juventude da influência de pais cristãos e, para isso, vale tudo. Vale inclusive a contradição de, por um lado, retardar a responsabilização e, por outro, antecipar a autonomia. Vale também criminalizar a conduta de pais que disciplinam os filhos, embora nada faça para coibir a disciplina do Estado nas detenções e penitenciárias. Assim, em um ambiente de filhos imunes à responsabilização e dotados da maior e mais precoce autonomia possível, ficam eles absolutamente libertos das amarras morais de uma piedade que convencerei a todos como sendo ultrapassada.

“Mas, de todas as minhas estratégias, nenhuma é comparável à banalização do casamento e a promoção da ideia de sua insuficiência como alicerce da família. Usarei os pregadores da nova religião para fomentar a valorização de uniões livres em detrimento de relações indissolúveis, a máxima liberdade para o divórcio, a construção de possíveis relações de todos com todos, indistintamente, dissociando as afeições humanas dos limites impostos pelo Criador. Meu objetivo é enterrar a velha moralidade e a ultrapassada noção de pecaminosidade, para ver brotar uma nova moralidade centrada em novos marcos civilizatórios, cujos valores centrais giram em torno do respeito (e da admiração até) para com aquilo que sempre foi tido como abominável. 

“Mas não só! Tudo isso será inserido paulatina, mas constantemente, por tantos veículos, pelos mais destacados arautos e com tantos argumentos plausíveis que ir de encontro a essa “razão pública” será uma atitude socialmente suicida, racionalmente inaceitável e ideologicamente abominável. Enfim, vou tornar toda a velha religião proscrita!”

*Somos uma marca de teologia reformada comprometida em transmitir a mensagem da fé de forma clara, direta e eficaz para um mundo que precisa do amor e da graça de Deus.

Saiba mais